Estudo do IDOR, em parceria com outras instituições, descobriu concentração do novo coronavírus em estrutura do sistema nervoso central
Pesquisadores do Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino (IDOR), UFRJ e Instituto do Cérebro descobriram que o vírus da Covid-19 é capaz de invadir o sistema nervoso central (SNC) de crianças, a partir do plexo coroide, e causar uma série de complicações. Esta descoberta inédita, que faz parte dos estudos da Ciência IDOR Contra a Covid-19 (CIC-19), chama atenção para o potencial de complicações neurológicas em qualquer população, e foi tema do artigo publicado nesta segunda-feira (14/9) em uma plataforma de pré-print. Ainda aguardando a revisão de outros cientistas, a pesquisa obteve centenas de downloads logo nos primeiros minutos de sua publicação.
Os possíveis efeitos do novo coronavírus sobre o SNC foram surpreendentes, já no início da pandemia. Desde março, já se estranhava o fato de que um dos sintomas distintivos da doença era a perda do olfato (anosmia), característica que se manifesta em infecções de vias aéreas, e é igualmente comum em doenças neurodegenerativas, como parkinson, alzheimer e esclerose múltipla. Depois, começaram as surgir casos de acidente vascular cerebral (AVC) em pacientes de diferentes faixas etárias e sem fatores de risco identificados, em uma parcela relevante de pacientes com Covid-19 grave. O processo através do qual esses casos de hipercoagulação e eventos trombóticos ocorriam também foi analisado em outro estudo da CIC-19.
Na publicação atual, a pesquisa partiu dos achados da autópsia de uma criança de 1 ano de idade, que não resistiu à falência pulmonar devido a uma pneumonia causada por coronavírus. Como outro recente estudo da CIC-19 já havia salientado, crianças com comorbidades neurológicas ou respiratórias crônicas têm mais chances de desenvolver Covid-19 grave, o que era o caso da bebê estudada, que já sofria com encefalopatia – problema que altera o funcionamento ou estrutura do cérebro – e apresentava ataques epilépticos.
Embora o Sars-Cov-2 não afete diretamente células como os neurônios, na autópsia notou-se que uma enorme infecção viral concentrava-se no plexo coroide, estrutura do SNC que possui uma barreira hematoencefálica – estrutura que isola o cérebro do restante do organismo – mais frágil do que a encontrada em outras áreas do cérebro, o que o torna mais vulnerável à infecções. Além disso, o plexo coroide também concentra grandes quantidades de ECA2, proteína à qual o vírus se conecta para invadir o organismo e que também é encontrada em abundância nos pulmões.
A principal causa de complicações na Covid-19 é a ocorrência de uma inflamação amplificada, chamada tempestade de citocinas, que pode levar à formação de coágulos sanguíneos com entupimento de múltiplos vasos em todo o corpo, comprometendo o funcionamento de diferentes órgãos, e causar derrames no cérebro. Nos casos de maior dano neurológico, observa-se uma ruptura da barreira hematoencefálica, desprotegendo o cérebro das partículas virais e da ação inflamatória, podendo causar convulsões, confusão mental e coma, com possíveis sequelas, após a recuperação. No caso estudado, a infecção ocasionada pelo Sars-Cov-2 causou na criança pneumonia, meningite e danos em múltiplos órgãos devido à trombose, como rins, pulmão, cérebro, coração e pâncreas.
O artigo reforça que, apesar de intensamente preocupante, casos como o analisado são raros, tanto em crianças como em adultos, mas a diferença da ação da Covid-19 entre essas duas populações ainda não é clara. Embora a infecção do Sars-Cov-2 não consiga se difundir de forma eficaz no SNC, os pesquisadores afirmam que ela pode afetá-lo de forma colateral e grave. Por isso, as descobertas deste estudo também oferecem caminhos consistentes para que se façam mais pesquisas e se desenvolvam medicamentos capazes de reduzir, ou até mesmo de evitar, desfechos tão lamentosos.
Escrito por Maria Eduarda Ledo.
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