Síndrome demencial que afeta linguagem é tema de estudo do IDOR que se encontra em fase de recrutamento de pacientes
As demências são quadros neurodegenerativos que compreendem um grande número de doenças. Apesar de serem agrupadas sob um mesmo termo e possuírem algumas características em comum, existem dezenas de diagnósticos de demência, e o reconhecimento das particularidades e correta designação de cada caso clínico é crucial para a terapêutica adequada e a qualidade de vida do paciente e de seus familiares.
Um diagnóstico que abrange de 5% a 10% dos casos de síndromes demenciais são os das demências frontotemporais (DFT), que estão associadas a um depósito proteico anômalo no cérebro, e afetam principalmente o comportamento, personalidade e a linguagem dos indivíduos, diferindo da associação popular de que essas doenças estariam sempre relacionadas à memória, como ocorre com a doença de Alzheimer.
Os sintomas da DFT se iniciam na maioria dos casos entre os 45 e 65 anos de idade, mas podem também se manifestar mais cedo ou mais tarde e, em alguns casos, a doença também pode afetar os músculos da cabeça e do pescoço. Elas são segmentadas em três variantes clínicas: uma variante comportamental e duas variantes de Afasia Progressiva Primária (APP), que são as variantes gramatical e semântica. A APP, contudo, é uma síndrome neurológica mais complexa, que apresenta ainda duas outras variantes que não necessariamente se enquadram na DFT, são elas a variante logopênica e a variante mista, que engloba aspectos de mais de uma subdivisão clínica da APP. Entenda as diferenças abaixo:
Variante Comportamental da DFT: Como designa o nome, a característica mais notável desse subtipo é uma súbita mudança de comportamento no paciente. “Uma pessoa que nunca apresentou hábitos como participar de jogos de azar pode repentinamente passar a se viciar naquilo, ou em outras atividades compulsivas que nunca haviam despertado interesse anteriormente. Também pode passar a ser uma pessoa mais falante e muito desinibida em conversas, chegando a alcançar um comportamento socialmente inconveniente”, ilustra o Dr. Paulo Mattos, psiquiatra pesquisador do Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino (IDOR) e do Centro de Neuropsicologia Aplicada (CNA). Também há casos em que os pacientes ficam apáticos e perdem o interesse em seus familiares e atividades sociais.
Variante Gramatical da APP: Todas as expressões da APP apresentam problemas linguísticos, mas essa subdivisão é marcada pelo esforço para verbalizar palavras, que muitas vezes soam incorretas ou com pronúncia pouco convencional, além de erros gramaticais muito evidentes.
Variante Semântica da APP: Os pacientes dessa divisão mostram dificuldade de abstração e em entender frases mais complexas. Costumam “perder” palavras que buscam para se referir a objetos e verbos. Ao serem pedidos para desenhar uma tartaruga, por exemplo, podem esquecer de representar características marcantes, como o casco do animal, devido à perda do significado da palavra.
Variante Logopênica da APP: Essa variante está comumente associada à doença de Alzheimer e não se enquadra como uma DFT. O paciente não apresenta dificuldades de pronúncia nem semântica. A dificuldade em encontrar palavras para concluir pensamentos é marcante, o que pode deixar o discurso lacônico.
Variante Mista: Alguns pacientes apresentam sintomas de mais de um tipo de APP, sendo enquadrados como uma subdivisão mista.
A correta designação da variante da APP é um dos pontos mais desafiadores do diagnóstico. Na realidade, o próprio diagnóstico da APP é muito difícil e geralmente tardio, porque muitas das mudanças comportamentais da doença podem ser interpretadas inicialmente como problemas psiquiátricos, a exemplo do transtorno bipolar, transtorno obsessivo compulsivo e depressão.
É necessário um exame de neuroimagem para compreender se está ocorrendo ou não um processo neurodegenerativo no paciente, e caso esse quadro clínico seja identificado é ainda necessário realizar outros exames e avaliações neuropsicológicas para diferenciar outras doenças neurodegenerativas, como demência com corpos Lewy e Alzheimer. “Os principais profissionais da saúde que identificam que o paciente pode ter APP são os neurologistas, geriatras, psiquiatras e fonoaudiólogos. Esses últimos costumam identificar rapidamente o problema, mas um dificultante é o fato de que muitas clínicas que oferecem o serviço não atendem adultos ou idosos”, comenta o Dr. Paulo Mattos.
No momento, está em andamento no IDOR uma pesquisa voltada à APP. Um dos principais objetivos do estudo é entender melhor a doença e aprimorar a classificação de suas variantes. O estudo está recrutando pacientes voluntários residentes na cidade do Rio de Janeiro ou proximidades, que podem ser indicados por seus médicos e familiares. Para a inscrição, é necessário enviar nome e idade do paciente, nome do familiar de referência, e telefone de contato para o e-mail: [email protected] . A participação no estudo envolverá preenchimento de questionários, avaliação neuropsicológica e fonoaudiológica detalhadas e realização de exames de sangue e ressonância magnética.
Escrito por Maria Eduarda Ledo de Abreu.