Artigo com participação do IDOR expõe como a disparidade econômica global impacta a produção de pesquisas em cuidados críticos no mundo
Artigo com participação do IDOR expõe como a disparidade econômica global impacta a produção de pesquisas em cuidados críticos no mundo
Em uma nova publicação da revista Intensive Care Medicine, um artigo revelou dados sobre a desigualdade científica entre países desenvolvidos e subdesenvolvidos, focando principalmente nos estudos referentes ao atendimento a pacientes críticos. A pesquisa foi desenvolvida por médicos brasileiros do Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino (IDOR), do A. C. Camargo Cancer Center e do Hospital Mater Dei Porto Dias.
A desigualdade econômica é um grande desafio social para diversas nações e entre diferentes nações. A inequidade de renda e recursos impacta diretamente a educação e os indicadores sociais e de saúde de uma população. Embora seja de senso comum apontar as variadas consequências dessas assimetrias, os dados quantificados sobre essas discrepâncias globais ainda são escassos, principalmente no referente à produção científica.
Levando em consideração essa lacuna, os autores buscaram levantar diferenças na produção científica em terapia intensiva, um tema muito relevante quando consideramos que outras pandemias globais, como a de 2020, podem se tornar cada vez mais frequentes.
Para coletar as informações, os pesquisadores separaram todos os países em diferentes faixas de renda, definidas de acordo com o Banco Mundial, e associaram a relação que a produção científica em cuidados críticos estabelecia com o produto interno bruto (PIB) de cada país. O recorte para a coleta do número de publicações foi de 2018 a 2022, e os cientistas também coletaram dados sobre a população, PIB e PIB per capita (por pessoa) de cada país em 2022.
Os resultados apontaram que os países de alta renda (high-income countries -HIC, da sigla em inglês) publicaram 68,3% dos artigos em medicina em geral e 77,9% dos artigos em terapia intensiva nos 5 anos analisados. A discrepância desse número fica mais clara quando consideramos que 75% da população mundial vive em países de renda média (MIC).
Segundo o estudo, à medida em que o PIB per capita de um país aumenta, também aumentam as suas publicações. Nos países de média renda, aqueles com as maiores populações também são os que mais publicam, como é o caso da Índia, da China e do Brasil.
O Dr. Antonio Paulo Nassar Junior, pesquisador do IDOR que liderou o estudo, revela que o nosso país é o 15º a mais produzir artigos e sua participação representou 1,9% de toda a produção global em 2022. Nos anos analisados, esse valor saiu de 1,7% em 2018, subiu para 2,2% em 2019, ficou em 2,1% em 2020 e 2021 e caiu para 1,9% em 2022.
Na análise por continente, a América do Norte e a Europa lideram as publicações do mundo, mas os autores comentam que nos 5 anos analisados os países de baixa e média renda conquistaram um aumento de 5% em sua produção científica.
Segundo os pesquisadores, a razão para essa disparidade não se dá apenas ao fato de os países mais ricos possuírem um PIB per capita mais alto, mas também por destinarem uma porcentagem maior do seu PIB para saúde, educação, pesquisa e desenvolvimento. Esses investimentos se traduzem em mais financiamento, maiores recursos e uma melhor infraestrutura de pesquisa.
Eles pontuam que o número maior de publicações em países do Norte Global também pode contar de algum modo com um viés de publicação, uma vez que os periódicos podem priorizar publicações de instituições e autores prestigiados localizados nos países de alta renda. Além disso, apesar de muitas revistas isentarem países de baixa renda do pagamento de taxas de processamento de artigos, elas ainda representam uma barreira para países emergentes de renda média, pois há diferenças significativas no poder de compra de seus pesquisadores.
O Dr. Nassar Junior comenta que “O estudo é importante por mostrar que as desigualdades na produção científica em terapia intensiva, uma área que se mostrou tão vital na pandemia, são maiores do que aquelas que ocorrem apenas devido às diferenças socioeconômicas”.
O autor reforça que é essencial reduzir a assimetria da produção científica e do atendimento médico entre os habitantes do mundo, pois essas disparidades resultam em problemas para a população global. “Vivemos em uma realidade globalizada em que as pandemias são uma ameaça que não distingue fronteiras”, ressalta.
Entender as origens dessa desigualdade em todos os seus aspectos, incluindo os econômicos, é um esforço que pode trazer benefícios e auxiliar na implementação de políticas públicas globais voltadas para a ciência e para o atendimento médico de todo o mundo.
Escrito por Maria Eduarda Ledo de Abreu.
Ilustrações: Storyset