Pesquisa aponta DNA tumoral circulante como ferramenta importante no monitoramento de câncer.
Pesquisa aponta DNA tumoral circulante como ferramenta importante no monitoramento de câncer.
Pesquisadores do Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino (IDOR), em parceria com o Instituto do Câncer do Estado de São Paulo, desenvolveram um estudo utilizando o DNA tumoral no monitoramento de carcinoma epidermoide cervical e de canal anal em pacientes submetidos à quimiorradioterapia. Dra. Camila Venchiarutti Moniz, oncologista, pesquisador do IDOR e primeira autora do estudo, apresentou os resultados no ASCO Annual Meeting 2024, promovido pela American Society of Clinical Oncology.
O carcinoma epidermoide cervical e de canal anal representam um desafio significativo para a saúde pública, especialmente em países subdesenvolvidos. Quando esses tumores se apresentam localmente avançados, a radioterapia associada à quimioterapia, chamada quimiorradioterapia (QRT), é usada com propósito curativo. No entanto, o monitoramento da resposta ao tratamento por métodos convencionais de imagem clínica é muitas vezes prejudicado pela inflamação loca,l que dificulta a identificação precoce dos não respondedores. A avaliação do DNA tumoral circulante (ctDNA) se apresenta como uma ferramenta promissora para monitorar a resposta tumoral em tempo real.
O tumor é capaz de liberar fragmentos de seu DNA na circulação sanguínea, logo, a pesquisa destes fragmentos através se um exame de sangue tem potencial para avaliar se o tumor permanece viável ou não após o término do tratamento curativo. Neste estudo os pesquisadores avaliaram a evolução do ctDNA antes, durante e após o tratamento. Aqueles participantes que não apresentaram negativação do ctDNA circulante apresetaram maior chance de recorrência ou persistência de doença ao longo do seguimento. O tempo de vida (sobrevida global) e o tempo sem evidência de doença detectável (sobrevida livre de progressão) também foi menor nesta população.
O estudo, realizado multicêntrico e prospectivo, analisou pacientes tratados entre 2020 e 2023 em centros oncológicos terciários no Brasil, focando no papel do monitoramento dinâmico por ctDNA em câncer epidermoide cervical (CC) e anal (CA). O objetivo principal era estimar a correlação do ctDNA com a resposta tumoral, avaliada por imagem de rotina e avaliação clínica na 8ª semana do tratamento de QRT. Também foram avaliados a sobrevida livre de progressão (SLP) e sobrevida global (SG) em diferentes momentos, além de avaliar o potencial do ctDNA como um biomarcador capaz de indicar a presença da doença.
A sobrevida é um parâmetro muito importante para avaliar a resposta ao tratamento. A sobrevida global diz respeito à mortalidade geral dos pacientes com uma determinada doença, independentemente da causa do óbito ser a própria doença e suas complicações ou qualquer outra razão. A sobrevida livre de doença refere-se ao período após o tratamento de uma doença específica, durante o qual o paciente permanece sem nenhum sinal da enfermidade.
Dos 33 pacientes, 27 passaram pela avaliação do ctDNA, com seguimento mediano de 10 meses. A maioria era composta por mulheres e 11% dos pacientes eram HIV positivos. No grupo de câncer anal, a maioria recebeu QRT com capecitabina e cisplatina, enquanto no grupo de câncer cervical, todas as pacientes receberam cisplatina.
Os resultados mostraram que todos os pacientes expressaram ctDNA+ antes do tratamento. Na 8ª semana, ao avaliar a progressão tumoral, os exames de imagem apresentaram a sensibilidade de 42,8% e a especificidade de 100% para progressão da doença, enquanto o ctDNA apresentou uma sensibilidade de 85,7% e especificidade de 89,4%. Após o término da QRT, os resultados de ctDNA se mantiveram consistentes com os apresentados nas semanas 8 e 24, indicando um alto risco de progressão da doença, com uma SLP de 8,2 meses comparada à não alcançada no grupo ctDNA-.
Os pesquisadores sugerem que o ctDNA pode ser considerado na adaptação de estratégias de tratamento oncológico, oferecendo uma perspectiva inovadora para melhorar os resultados em pacientes com essas condições desafiadoras. Atualmente o IDOR possui estudo aberto avaliando este biomarcador em câncer de ovário, bexiga e mama. No ICESP o estudo ANA avaliará o uso de imunoterapia precoce na população de pacientes com tumores de colo de útero e canal anal que permanecem com ctDNA positivo após o término do tratamento curativo, com objetivo de aumento da taxa de cura desta população.