Estudo procura métodos mais sensíveis de diagnóstico diferencial para as duas infecções.
Zika e chikungunya são doenças com muito em comum: além de circularem no Brasil, são transmitidas pelo mesmo vetor – o mosquito Aedes aegypti – e podem apresentar sintomas semelhantes, incluindo febre, manchas vermelhas e coceira na pele, dores nas articulações e vermelhidão nos olhos. Exatamente por isso, uma dificuldade que os serviços de saúde encontram é fazer o diagnóstico diferencial entre essas doenças. Em estudo recente, especialistas do Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino (IDOR) propõem a utilização combinada de diferentes metodologias para permitir a identificação precisa do vírus causador de infecção.
Embora ainda não haja tratamentos eficazes disponíveis contra zika ou chikungunya, determinar corretamente o diagnóstico dos pacientes que chegam aos postos de saúde é fundamental para estimar riscos para a saúde pública e planejar ações preventivas. No entanto, atualmente, os métodos diagnósticos não são suficientemente confiáveis. “Em nosso levantamento, observamos que o diagnóstico sorológico para infecção por zika só foi bem sucedido em, no máximo, metade dos pacientes”, alerta Felix Drexler, chefe do departamento de epidemiologia das infecções virais no hospital universitário Charité, em Berlim (Alemanha), e coautor do artigo, publicado na edição de fevereiro da revista Emerging Infectious Diseases.
De maneira geral, existem duas formas de se confirmar um diagnóstico de infecção viral: métodos moleculares e métodos sorológicos. No primeiro caso, o que se faz é buscar, em amostras de sangue ou urina de pacientes, o DNA do vírus causador da doença. “O problema é que o tempo de circulação desses vírus no organismo é muito curto”, explica o infectologista Fernando Bozza, pesquisador do IDOR e da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), autor principal da pesquisa. Já o diagnóstico sorológico procura identificar no sangue humano os anticorpos produzidos após o contato com os vírus. “Nesse caso, a dificuldade é que o exame só pode ser realizado algum tempo depois da infecção”, completa o especialista.
Ainda segundo Bozza, outra limitação dos métodos diagnósticos sorológicos é que os anticorpos podem circular no corpo até muito tempo depois do contato com o vírus. Assim, o fato de se identificar na amostra de um paciente o anticorpo contra os vírus zika ou chikungunya não quer dizer, necessariamente, que este ou aquele são os vírus causadores da atual infecção. “A pessoa pode ter tido contato com o vírus antes, sem apresentar sintomas, e por isso apresentar os anticorpos”, sugere. A imunização com vacinas contra vírus semelhantes também pode dificultar o diagnóstico sorológico.
No estudo, foram incluídos pacientes infectados por zika e chikungunya. “Um diferencial é que coletamos amostras sequenciais de cada paciente, acompanhando-os por um período de 90 dias após a infecção aguda”, conta Bozza. Os especialistas aplicaram diferentes métodos de diagnóstico molecular e detecção de anticorpos.
A detecção molecular revelou baixa concentração dos vírus, mesmo apenas uma semana após a apresentação dos sintomas. E o diagnóstico sorológico também demonstrou limitações, particularmente no caso da zika: a sensibilidade de um teste imunológico frequentemente utilizado foi de apenas 30%. Para solucionar o problema, o caminho encontrado pelos pesquisadores foi usar um tipo diferente de anticorpo como marcador. “Em vez de procurar a imunoglobulina M (IgM), produzida na fase aguda da infecção, aumentamos a sensibilidade do teste procurando a imunoglobulina A (IgA)”, revela Bozza.
Dessa forma, o diagnóstico da zika ganhou credibilidade. Segundo os autores do trabalho, a pesquisa possibilitará o aperfeiçoamento dos testes de diagnóstico diferencial, o que tem relevância redobrada para orientar o atendimento de mulheres grávidas, uma vez que o vírus zika, contraído durante a gravidez, pode causar má formação do sistema nervoso central, numa condição conhecida como microcefalia.
“Vemos claramente que uma combinação de diferentes testes deve ser usada para obter resultados precisos para o diagnóstico da zika, sobretudo em regiões tropicais onde as pessoas contraem infecções de vários vírus relacionados uns com os outros”, conclui Drexler. Para uma proposta definitiva de novo método diagnóstico, baseado na combinação de diferentes testes, serão necessários novos estudos, com um maior número de pacientes.
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